Crédito do vídeo: The Guardian
Caiu na rede é peixe. Antes da internet existir, dificilmente, o mundo ficaria sabendo sobre dois ataques de tubarão, em menos de 12h, ocorridos a poucos quilômetros do palanque do Margaret River Pro, etapa CT (“elite” do surfe mundial).
Por Janaína Pedroso
Pior (ou melhor?), o mundo não teria assistido aos minutos mais aflitivos de Mick Fanning na costa africana, enquanto se debatia na ânsia de se livrar de um grande tubarão branco, em 2015.
A temível espécie, que navega próxima à costa da África, é a mesma que curte, vez ou outra, provar umas pernas, braços e, às vezes, até uns corpos inteiros na Austrália. Quem se arrisca a nadar ou a surfar na costa ocidental, principalmente, está sujeito a dar de cara com um tubarão branco. Animais que chegam a medir 7m de comprimento e a pesar umas 2,5 toneladas, um encontro nada agradável eu diria.
“Como vocês conseguem surfar sabendo que há tubarões ali?” Perguntei. Ele parou, me olhou, e com um sorriso de canto retrucou com uma pergunta: “E como você consegue sair de casa em paz em São Paulo sabendo que pode ser morta a qualquer momento?” A discussão terminou ali, ele tinha razão.
Margaret River talvez seja um dos lugares preferidos do grande predador. Mais ao norte há ainda um conhecido pico chamado Red Bluff, é tipo a sala de estar dos “caras”. Lá meu amigo, só se aventura que tem um parafuso a menos.
Durante minhas andanças por Perth (WA), que duraram cerca de dois anos, cansei de ler manchetes nos jornais sobre ataques de tubarão naquela região. Mesmo assim sonhava surfar lá, mas quando visitei Margaret não tive coragem de entrar na água. Não sei bem explicar o que senti, mas um medo enorme de ser devorada tomou conta de mim.
Ler desabafos como o de Ítalo e Medina dá certo alívio, nem tudo está perdido. É preciso questionar e falar sobre quão arriscado pode ser expor os melhores surfistas do mundo (e qualquer outro ser humano, por favor, não me entenda mal) a este tipo de acontecimento. Mick Fanning que o diga.
O ano de 2015 poderia ter sido uma tragédia. Arrisco dizer que se o tricampeão mundial de surfe tivesse sido morto ao vivo, teria sido o fim da WSL. Por outro lado, picos como Bell´s, Margaret e J-Bay são icônicos e seria lamentável abrir mão dessas etapas no tour.
Uma vez indaguei um australiano a respeito dos ataques de tubarão na Austrália e a forma como eles lidam com isso. “Como vocês conseguem surfar sabendo que há tubarões ali?” Perguntei. Ele parou, me olhou, e com um sorriso de canto retrucou com uma pergunta: “E como você consegue sair de casa em paz em São Paulo sabendo que pode ser morta a qualquer momento?” A discussão terminou ali, ele tinha razão.
Nós, por aqui, nos acostumamos e aprendemos a lidar com a violência. Já eles, por lá, se acostumaram a lidar com ataques de tubarão.
Segundo documentário divulgado pelo jornal carioca, O Globo, foram 786.870 homicídios no País, de 2001 a 2015. Um ano mais tarde, em 2016, o Fórum Brasileiro de Segurança Publica revelou um número ainda mais alarmante: 7 pessoas são assassinadas por hora no Brasil, por HORA!
Já na Austrália, e especificamente em Margaret, desde 2004 foram três os surfistas que perderam a vida enquanto surfavam: Chris Boyd, Nick Edwards e Bradley Smith.
A intenção não é, jamais, comparar mortes, até porque morte é algo que não se compara de jeito nenhum. Bizarro seria dizer que uma vida vale mais do que a outra. Algo como: Mick Fanning ser morto por um tubarão é muito pior que um jovem negro periférico ser assassinado no Brasil. As duas coisas são igualmente péssimas na minha visão.
Se decidirem questionar a retirada de etapas em picos onde a presença de tubarões é certa, como Margaret, Bells, J-Bay ou até Gold Coast e Havaí, será preciso repensar a realização de qualquer etapa realizada no Brasil. Ou não?
Confira o vídeo feito minutos após o ataque (desaconselhável para quem não curte ver sangue):
Brasil também sofre com ataques
No último domingo (15), um brasileiro foi atacado por um tubarão, na Praia de Piedade, região metropolitana de Recife (PE).
As imagens são fortes. É possível ver cortes profundos nos brações, pernas e tronco de Pablo de Melo, que foi levado ao Hospital da Restauração (HR), em estado grave.
De acordo com levantamento do Comitê Estadual de Monitoramento de Incidentes com Tubarões, atualizado em fevereiro deste ano, Pablo é 64ª vítima de ataque de tubarão no estado pernambucano.
Vale lembrar que Pernambuco, em 2017, bateu seu recorde de homicídios, num período de 14 anos. Divulgados pela Secretaria de Defesa Social (SDS), os números demonstram uma média estarrecedora de 12,7 pessoas assassinadas por dia no estado.
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