Confira relato emocionante da surfista Julia Torsani, sobre sua jornada no surfe, conquistas, traumas e alegrias do surf feminino
Comecei a surfar aos 6 anos, em 2002, por influência dos meus irmãos que já surfavam.
Um ano mais tarde virei competidora e aos 8 anos já era considerada a quarta melhor Grommet do País. Com o passar do tempo, o surf feminino se desenvolvia na minha cidade, Mongaguá, litoral sul de São Paulo. Éramos em poucas atletas (eu era mais nova), na época havia muito mais competições de surf feminino.
Em 2009 o barco começou a afundar. E aos 13 anos me vi pela primeira vez sem patrocínio algum. A Prefeitura – que antes ajudava – começou a não apoiar mais. Cortou o transporte, as inscrições e também foi parando de realizar o Circuito Municipal.
Segui correndo atrás para representar a cidade em campeonatos regionais e nacionais, mas se tornou muito difícil sem apoio financeiro. Até que com 16 anos, já sem circuito de Mongaguá (a cidade não sediava mais competições importantes como o Paulista Masculino entre outros), eu revoltada e desanimada, decidir ir embora pra São Paulo.
Dar um rumo na vida. Trabalhar, estudar e etc, mas nunca consegui me desligar do surfe totalmente. Mesmo longe do mar, procurava incentivar o surfe e especialmente o surf feminino. Enquanto estive em São Paulo, surgiram novas gerações do surfe feminino, e então, aos poucos, começaram a voltar os campeonatos. Porém ficava inconformada pelas competições não terem a categoria feminina.
Minha arma eram as redes sociais. Sempre as usei para me manifestar e pedir para que as outras meninas exigissem a categoria, pois existíamos e queríamos competir.
De longe, vi o surgimento de Júlia Santos, atleta de São Vicente, que em pouco tempo se tornou uma gigante da modalidade. Ela evoluiu demais e mostrou um surfe muito potente e moderno. Entretanto ela nunca teve patrocínio, nem quando surgiu nem agora.
Aos poucos eu via alguns eventos voltando…
Me tornei mãe aos 18 anos de idade. Meu filho nasceu na praia, em Itanhaém, e quatro meses após o parto retornei ao surfe. E quando havia competições, mesmo sem treinar, com sobrepeso, eu participava mas via que as pessoas me olhavam diferente.
Em abril do ano passado, o Circuito Municipal de Mongaguá voltou a acontecer. Usei minhas redes para divulgar o campeonato e atrair meninas para a categoria. Consegui que treze garotas participassem.
Meses depois criei um grupo no WhatsApp chamado Crowd Florido, no início eramos em oito mulheres. Usava o grupo para incentivar elas, informar sobre competições, inscrições, cronograma. Falávamos de surftrips, nos encontrávamos nos raros campeonatos.
Foi um retorno legal. Mas a felicidade durou pouco. Sem apoio, sem incentivo, filhos, trabalho, estudo, e apenas uma etapa do Brasileiro, fizeram com que caíssemos na real, novamente.
Entrou 2017, e com ele um desanimo total. Ouvia as pessoas me dizendo que eu não tinha corpo de atleta. De fato, eu não estava dentro dos padrões aceitos pela sociedade. Depois da maternidade engordei e lutava para voltar a antiga forma.
“Você não é mais atleta”. Todas as vezes que essa frase vinha na minha cabeça eu descontava na comida. E perder peso virou uma missão impossível na minha cabeça. Mas nunca larguei o surfe. Se não era mais aceita como atleta passei incentivar as meninas que ainda tinham alguma chance.
Logo de cara um balde de água fria. Soube que não haveria mais a categoria feminina no principal circuito da cidade. O motivo alegado era o número insuficiente de garotas. Também pudera. Nunca fomos incentivadas a surfar e muito menos a competir.
Eis que, atletas de outras cidades, começaram a perguntar o motivo por terem eliminado a categoria do evento. Explicada a razão, comecei a receber manifestações de incentivo. Muitas meninas dizendo que iriam competir.
Através do facebook passei a convidar cada atleta, do litoral sul a norte. “Se tivesse a categoria você participaria?” Uma enxurrada de sim’s começaram a aparecer no meu inbox.
Apresentei aos organizadores do evento, que insistiam em afirmar que não havia surfistas suficientes, uma lista de meninas e pedi a chance de recolocar a categoria no campeonato.
Ao todo éramos vinte e cinco surfistas. O mesmo número de atletas da categoria open Masculina. E sabe o que foi mais legal? A categoria feminina foi um evento a parte.
A partir deste evento o #CrowdFlorido criou força e só me deu mais vontade de ajudar, de incentivar e vontade de fazer algo a mais para elas.
Eu infelizmente não penso mais em voltar a surfar. Lamento muito que durante minha jornada tenha sido tão desestimulada a me dedicar ao esporte. Nem dentro de casa recebia apoio. Apesar de certa mágoa, hoje encontrei uma nova forma de estar inserida neste contesto de campeonatos de surfe que eu tanto amo.
Quero criar com a ajuda de mais mulheres, um Festival de Surfe Feminino repleto de muito amor e show de surf, com intuito de ampliar a visão de marcas e investidores – para finalmente –, enxergarem o surf feminino novamente. Unir famílias e contribuir para o crescimento da nova geração que está cheia de talentos!
FIM…ou apenas um novo começo?
Júlia parabéns querida de todas as flores…o Crowdflorido vai florir intensamente começando pela sua raiz…vibrações positivas sempre…aloha!
Valeu Nadine! ALOHA!!
Sua história é linda, seu apoio as meninas do surf é lindo, não desista NUNCA! Temos muito orgulho de vc! ❤️
<3