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‘Quando visitei uma fábrica de prancha percebi a quantidade de sujeira, sobras, foi um choque’

por | fev 6, 2020 | Ambiente, Destaque, Entrevistas | 8 Comentários

Surfista, shaper e designer, Filipe Blanco conta a experiência com pranchas recicladas e como se tornou referência no assunto aqui no Brasil

por Janaína Pedroso

Nascido em uma família de sucateiros, como ele a autodenomina, Filipe cresceu em meio a coisas usadas. Ele acredita que este fato tenha sido determinante para ir em busca de alternativas sustentáveis no mercado de fabricação de pranchas.

Com ousadia e muita criatividade, Blanco se orgulha de ter sido um dos pioneiros na criação de uma prancha feita a partir de retalhos. “Usei mais de oitenta pedaços de EPS (isopor), papelão para fazer a longarina, restos de fibra e resina no stand-up reciclado”, conta.

Filipe apresenta seu projeto para o multi campeão Kelly Slater. Foto Arquivo Pessoal.

Com vocês, Filipe Blanco:

A reutilização de materiais vem da minha família que trabalha com sucata há 80 anos, o antigo ferro-velho, como chamávamos antigamente.

Então, sempre me vi nesse mundo cheio de coisas usadas. E muitas vezes meus presentes vinham da sucata, e não por falta de condições, mas por acreditar nesse conceito: por que comprar um novo se posso utilizar o que ainda tem uso?

Sou surfista desde criança, tive todos os tipos de equipamentos, e isso me despertou a vontade de ser surfista e trabalhar com surfe.

Eu como surfista e vindo de uma família de sucateiro não me conformava, era muito contraditório.

Filipe Blanco

Na década de 90, comecei a trabalhar com meu pai no Guarujá e lá conheci vários ícones do esporte como o Paulinho do Tombo, a galera da  Lightning Bolt, Shine, Paulo Rabelo, entre outros da época.

Foi nessa fase que lembro de ter visitado uma fábrica de prancha. Ali percebi a quantidade de sujeira, de lixo, sobras de poliuretano, parafina velha, foi um choque. Aquilo criou um grande conflito na minha mente.

Finalmente, decidi trabalhar com surfe, meu pai teve que fechar o negócio, era o momento. Lembro que o Paulo do Tombo, me disse: “Cara, ou tu vira surfista profissional ou vai fazer prancha”. Não havia muita opção além disso.

Mas, se virasse profissional morreria de fome, meus amigos já estavam dando aéreo na década de noventa, eu tava lascado. Então visitei a fábrica do Nando, um conhecido, ele foi quem me ensinou as primeiras técnicas de reparo em pranchas de surfe.

Inesperadamente, minha avó me emprestou um terreno e foi lá que comecei a consertar prancha. Reparei que tinha talento pra coisa. 

Ao passo que comecei a perceber o resíduo do reparo, já comecei a criar coisas com aquilo, como troféus, brindes, sempre relacionado ao surfe.

Posteriormente, fui trabalhar com outros shapers e ingressei em fábricas que produziam um número considerável de pranchas e então foi um choque mesmo. O negócio era sinistro, era muito lixo!

No entanto, eu sempre falava pra achar uma solução pra aquilo e os shapers davam risada de mim. A galera achava normal a indústria produzir aquele lixo.

Inegavelmente, comparado a outras indústrias, como do carro por exemplo, o lixo produzido na fabricação de pranchas é pequeno. Porém, eu como surfista e vindo de uma família de sucateiro não me conformava, era muito contraditório.

Inclusão social e sustentabilidade

Assim, fui criando projetos, incluindo amigos, ex-presidiários, dependentes químicos.. Até que finalmente consegui montei minha fábrica. São 21 anos trabalhando com surfe e procurando alternativas sustentáveis.

Além disso, em 2009, quando explodiu o mercado do stand-up, a sobra quadruplicou! Chegava nas fábricas via aquele monte de isopor virando lixo, aquilo me deprimiu muito. Foi então que criei minha primeira prancha totalmente reciclada.

Há pouco menos de dois anos, em  2018, criei o primeiro ponto do brasil e de descarte de equipamentos de esportes radicais e náutico em desuso ou danificados. Fica dentro do ferro velho do pai.

Novo projeto vindo aí: foilbaord sustentável!

Lá eu faço a gestão destes equipamentos, de forma os objetos que estão danificados eu conserto, outros vão para doação para escolinhas.

Para o futuro mais projetos

Ano passado, durante Mundial em Saquarema, em parceria com a Escola de Surfe de lá, fiz um workshop de reparo de pranchas, o Fast Repair 013. 

O projeto consiste em uma equipe de atletas, que correm circuitos mundiais e regionais (não só de surfe), fazemos os reparos e em contrapartida eles divulgam mundo afora a importância da reutilização, bom uso e preservação dos artigos esportivos.Quanto menos descarte melhor!

Minha meta este ano é unir ainda mais os dois projetos, a coleta e o reparo, para escolinhas, associações e quem mais tiver interesse.

Eu acredito que o futuro, ainda mais agora que o surfe vai crescer, com as Olimpíadas, vai aumentar o descarte, mais surfista quebrando prancha, enfim.

Inclusive estou aberto a parcerias! Empresas que tenham a mesma visão, com foco na sustentabilidade, indústria que queiram financiar pesquisas para a inovação para surgimento novos produtos, como fibras, tecidos e resinas. Não só produtos, mas também processos como é o caso da relojoaria fez com o Hayden.

Em resumo, o pool de projetos que envolve as pranchas de surfe recicladas, estação coleta e manutenção, chamo de Reciclador Peregrino. Afinal, com minhas andanças pelo mundo vou levando essas mensagens.

Créditos da foto de capa: Fernando Shiroma


No próximo post da série, o shaper Mario Ferminio conta tudo sobre sua resina vegetal!

Em 1989 na França, que descobri o EPS e epoxi. No caso do EPS sempre que a empresa vinha me entregar o bloco, retornavam todo resto para ser reciclado na fábrica, e no processo de fabricação do bloco para o shaper. Então, utilizo métodos ecológicos, desde então e fazia tudo isso sem saber nada sobre sustentabilidade. Até que em 2005, o surfe mundial levou um baque com o fechamento da maior fábrica de poliuretano do mundo. Nesse momento comecei a rever todos os meus materiais e processos de fabricação (…)

Mario Ferminino, shaper, contando quando passou a utilizar técnicas mais sustentáveis no processo de fabricação.
https://www.instagram.com/p/B7byq8mpCjQ/

Vai, mundo!

Você conhece alguém ou tem um projeto sobre produtos, técnicas e processos sustentáveis? Escreve pra mim!

Beijo e boas ondas 🙂

Sobre o autor

Origem Surf

Janaína Pedroso surfa há 21 anos. É formada em Comunicação Social/Jornalismo, com especialização em Roteiro para TV, Teatro e Cinema. Já atuou como apresentadora com passagens pela Globo, Band e CNT e como repórter para Editora Trip. Atualmente divide seu tempo entre a maternidade, o surfe, a produção de textos e à frente da empresa de comunicação Origem Press.

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8 Comentários

  1. Renato Sanches Leal

    Feliz em ver vc na Folha. Vi vc na barriga de minha prima querida !!!!

    • Antonio

      vale divulgar o trabalho da siebert em SC

      • ALEXANDRE

        Conhece a NANOPOXY? empresa 100% brasileira
        que desenvolveu uma resina bio para fabricação de pranchas com composição de 54% orgânica.

  2. Fernando Bonifacio!

    Parabéns pelo seu trabalho Felipe!

    • Filipe Blanco

      Obrigado Fernando!

  3. mgwin

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