Home > Destaque > A tribo do surfe e seus códigos

A tribo do surfe e seus códigos

por | jun 25, 2021 | Colab, Destaque | 7 Comentários

Em 1981 minha família se mudou de um apartamento para uma casa. Mudamos de uma parte adensada da cidade para uma mais residencial e para a minha sorte, na minha rua morava minha melhor amiga Claudia, e seus irmãos mais velhos, Bruno e Alberto Alves, os dois surfistas e aventureiros.

por Paula Rocha

Bruno, o mais velho, tinha uma kombi branca adaptada para ser uma casa. Ele era quase hippie, viajava o tempo todo sempre atrás do swell, que na época aprendi que é o grande responsável pela formação das ondas. Eu que até então fui uma menina de apartamento e clube, de repente descobri que poderia ser livre.

Maranhão. Foto Alberto Alves
Mossoró Foto: Alberto Alves

A Claudia viajava com os irmãos e eu também comecei a viajar com eles. Nosso destino era o litoral sul do Rio de Janeiro, Ubatuba e às vezes litoral norte de São Paulo. Na época não havia aplicativos de previsão de ondas, tudo era no feeling e na observação. Muitas vezes descíamos a pé a estrada para Trindade, em vão, mas tudo era uma curtição. O contato com o mar, com a natureza me fazia muito bem, eu voltava feliz e renovada do final de semana.

Nesta época, Bruno e Alberto já tinham viajado por todo o litoral do Brasil e feito algumas viagens internacionais. Possuíam um acervo precioso de imagens. Eles viajavam e fotografavam tudo: o surfe, o povo, a fauna e a flora locais.

Era incrível participar das sessões de slides na casa deles com músicas e explicações sobre mundos e culturas muito distantes: Havaí, Bali, Austrália, África do Sul… aprendi muito sobre a cultura desses países e o sobre o surfe naquelas noites. Eu era uma pirralha tentando entender aquele mundo novo que se abrira na minha vida. Observava os códigos, roupas, músicas e linguajar dos frequentadores. As fotos das manobras dos surfistas na água eram muito comentadas e logo entendi o que era uma batida e um cut back, regular (base do surfista, que coloca o pé esquerdo à frente da prancha) e goofy (pé direito à frente). Meus olhos brilhavam fascinados a cada aventura.

Uma noite fui com a Claudia e seus irmãos no Carbono 14, um centro cultural no Bexiga, onde acontecia de tudo na cidade, assistir um filme de surfe. Lá tive a certeza de que tinha encontrado minha tribo!

África do Sul – 1982 Foto: Alberto Alves

Todas as outras pessoas que eu conhecia viajavam no máximo para Miami, Disney e Nova Iorque.

O início da Fluir

Em uma tarde de 1983, Bruno e eu estávamos sentados no meio fio em frente à minha casa e ele me contou que iria montar uma revista de esportes radicais. Já tinham até escolhido o nome: Fluir.

Achei o máximo! Era um bom destino para tanta imagem linda e histórias incríveis que estavam até então represadas e restritas a um grupo de amigos. Na época existia a Visual, uma revista carioca e que cobria os eventos de surfe e asa delta do Rio de Janeiro. O surfe estava crescendo muito e tinha virado uma febre em todo litoral brasileiro. Faltava um meio de comunicação que falasse com essas pessoas.

A primeira edição saiu com fotos dos acervos das inúmeras viagens dos irmãos Alves e com a colaboração das fotos artísticas e lindas do Klaus Mitteldorf e do olhar profissional do Alberto Abreu Sodré, o Cação.

Foi incrível presenciar a materialização de uma ideia. Amigos jovens que se uniram para realizar um sonho. Eram empreendedores com propósito e que usaram seu network e muita autoconfiança para arriscar e inovar. Nesta época eles levaram a sério a frase: Este é seu mundo, faça-o à sua maneira ou alguém o fará por você.

Nascia aí a principal mídia do surfe brasileiro e que ajudou muito na profissionalização do esporte no Brasil. Mal sabia que todo esse meu fascínio anos depois iria me proporcionar anos mais tarde ser curadora de uma exposição de fotografias de surfe. Mas essa é outra história….

Foto: Bruno Alves
Fluir Número 1
Sobre o autor

Origem Surf

Janaína Pedroso surfa há 21 anos. É formada em Comunicação Social/Jornalismo, com especialização em Roteiro para TV, Teatro e Cinema. Já atuou como apresentadora com passagens pela Globo, Band e CNT e como repórter para Editora Trip. Atualmente divide seu tempo entre a maternidade, o surfe, a produção de textos e à frente da empresa de comunicação Origem Press.

Postagens relacionadas
Previsão das ondas em Teahupo´o para Olimpíadas

Previsão das ondas em Teahupo´o para Olimpíadas

Nathan Florence domina as ondas de Teahupo´o como nínguem. Irmão do talentosíssimo John John Florence, transmitiu informações e sua análise sobre as condições do mar e a previsão das ondas em Teahupo´o durante as Olimpíadas. De acordo com o surfista, a previsão sugere...

Confira a estadia dos surfistas nos Jogos Olímpicos

Confira a estadia dos surfistas nos Jogos Olímpicos

A contagem regressiva para o início da disputa do surf nos jogos olímpicos parece ter sido iniciada. Alocados em uma simpática acomodação no Taiti, os surfistas brasileiros parecem estar cercados de familiaridade e afeto. Ao menos essa é a sensação ao conferir a...

Surfistas brasileiros reunidos para a disputa dos Jogos Olímpicos

Surfistas brasileiros reunidos para a disputa dos Jogos Olímpicos

Único país com equipe completa na competição, surfistas brasileiros dos jogos olímpicos vão em busca das medalhas nas ondas de Teahupo'o. No domingo, 21, atletas realizaram o primeiro treino oficial no local. O Time Brasil está completo em Teahupo'o, no Taiti, para a...

7 Comentários

  1. Evandro

    Me desculpe Paula, mas a Fluir não foi a principal mídia do surf brasileiro . A Brasil Surf foi a primeira, lançada em 1974, graças a ela que vieram as outras mídias. Foi a pioneira no esporte e desencadeou uma verdadeira febre ao esporte que por muito tempo foi marginalizado. O surf nesta época tinha uma magia diferente, como disse o Bocão em uma entrevista, quem viveu naquela época participou de uma atmosfera ímpar (desde das músicas aos festivais de surf). E a presença da Brasil Surf neste cenário foi importantíssima para impulsionar o esporte no Brasil. O Brasil é uma país sem memória, você pode perguntar 10 surfistas novos, quem foi Pepê, talvez um saiba. Eu tinha somente 10 anos em 74 e ainda tenho a minha primeira Brasil Surf. Passei por várias gerações de surf desde que comecei a pegar onda com meus 9 anos. Posso lhe assegurar, que esta geração de hoje, não faz idėia nem de longe como era a magia de ser um surfista naquela época.

    • RAFAEL LOPES GASPAR

      A Brasil Surf foi a primeira mesmo…mas a principal revista de surf durante muitos anos foi a Fluir…sem sombra de dúvidas.

    • Luiz

      Concordo contigo, e achei um texto meio viajado. Parece que a ideia foi a nostalgia da autora, Paula.

      Não cita em que cidade está o Bixiga (Bexiga é outra coisa….) – considerando que só se ia “até o litoral norte de SP”.

      Quando li o título, em momento algum imaginei que iria se falar apenas da.Fluir, do Bruno, da Paula, e do relacionamento de amizade na juventude…

  2. Rubson Barbosa

    Independente da viagem do texto nas viagens mágicas do surf ,sabemos que só quem viveu o esporte nesse período tem a verdadeira noção da essência e da mágica dessa época.Antes marginalizado e parceiro da contracultura mundial ,tinha por objetivo alem das melhores ondas e histórias ( até os perrengues) a busca de uma liberdsde interior que acredito só o surf daquela época era capaz de trazer.e nesse ponto encontramos um esporte único e incomparável.

  3. Jorge Luis de Aguiar

    Achei muito Interessante a Matéria e os Comentários . ALOHA !

inscrição feita!

Pin It on Pinterest