A designer de joias Rachel Sabbagh, 56, já tinha desistido do sonho de surfar até ser convidada por uma amiga a fazer uma aula. Ao descer sua primeira onda, foi amor ao primeiro drop. O surfe hoje, a ajuda na saúde física e mental e ela virou fonte de inspiração para outros adultos que tinham medo ou vergonha de começar.

por Diogo Mourão

É só dar uma passada pelos principais picos do Brasil para ver que o outside tem cada vez mais mulheres. Bom, isso não chega a ser novidade, faz tempo que surfe não é mais um esporte de meninos, mas a mim impressiona, atualmente, o número de mulheres maduras na água. Fui conversar com a designer de joias para entender um pouco esse fenômeno. A explicação é simples, o bichinho do surfe não tem idade, é muito amor envolvido.

Rachel é daquelas mulheres que adoram o mar, a praia, fazer atividades, joga frescobol frequentemente na Praia do Diabo, ao lado do Arpoador. Quando fez 40 anos, viu uma reportagem sobre surfe após os 40 e achou que era a hora.

“Resolvi levar meus filhos para surfar. Pensando que poderia, quem sabe, também entrar nas aulas e aprender a surfar, mas não rolou. Eles não se empolgaram, eu trabalhava para caramba. Desisti! O surfe ficaria para outra encarnação, outra vida.

Quem acabou de pegar altas não quer briga com ninguém. Arquivo pessoal

Nova amiga mostra o caminho da felicidade

Não foi preciso esperar tanto.

“Como eu fazia muito esporte, gostava de praia etc, uma amiga resolveu me apresentar à prima dela, Isabel Lacerda, que, segundo a minha amiga, tinha tudo a ver comigo, era apenas um ano mais nova do que eu e surfava. Expliquei que era louca para surfar, mas que agora eu achava que já estava tarde”.

“Tarde nada, eu comecei há quatro meses, vamos lá”, respondeu a nova amiga.

“Foi ela quem me apresentou o Pretão (Alexandre Pretão, instrutor de surfe no Arpoador). E foi amor à primeira onda. Logo no primeiro dia consegui ficar em pé. Fiquei em estado de êxtase! Não parei mais”, diz Rachel.

Ela lamenta não ter surfado na adolescência ou infância, mas, por outro lado, ressalta como o esporte dos reis lhe faz bem agora:

“O surfe tem sido mega importante. É minha inspiração, minha saúde física e mental. Só alegria, desafio. Foi uma descoberta e tanto. Tá sendo incrível perceber, na maturidade, a evolução que o surfe me trouxe, em vários aspectos. Em resumo, o surfe para mim é  sinônimo de felicidade, superação, e tem sido muito importante na minha vida.”

Rachel vem se desafiando constantemente, encarando ondas maiores. Arquivo pessoal

Na Costa Rica, sufoco antes da onda da vida

Local do Arpoador, em seis anos de onda, Rachel já tem algumas surftrips no currículo, a mais marcante foi para a Costa Rica, com mais quatro alunas e um aluno do Pretão, levado pelo grupo.

“Tinha só um ano de surfe e foi incrível. Eram dois carros, íamos atrás das ondas. Demos muito sorte. Só mar bacana, boas ondas, alto astral. Conhecemos uns locais, que nos levaram até num secret point com uma esquerda sensacional, muito longa interminável”.

A esquerda era longa e interminável, mas a remada para entrar no mar também era longa e muito mais desafiadora do que as poucas remadinhas do Arpex, principalmente para quem estava comemorando seu primeiro ano de surfe:

“No meio do caminho, tomei na cabeça, perdi a prancha, arrebentou a cordinha. Eu falei. Ferrou, aí meus filhos, o que estou fazendo aqui? Isso não é para mim. Passei muito aperto. Quando eu vi, o Pretão estava atrás de mim, me jogou uma prancha e falou: vai rema!”

Rachel se encheu de coragem, varou a arrebentação e, ajudada pelo instrutor, entrou numa esquerda:

“Até hoje essa é a onda da minha vida. Lembro dela perfeitamente.  Foi incrível, uma esquerda interminável, com parede. Foi maravilhoso porque eu não traumatizei com o sufoco e deu para curtir muito a viagem. O Pretão disse que aquela foi a melhor onda da trip.”

Assim como a amiga foi importante para Rachel, a designer de joias também já virou modelo para amigos e amigas:

“Comecei a surfar com 50 anos. Acho que posso dizer que comecei bem essa segunda metade da minha vida. E já estou inspirando muitas e muitos a entrarem nessa onda”.

Em mais uma esquerda perfeita no Arpoador, Rachel agora serve de inspiração e mostra que não tem idade para se entregar a um novo amor. Arquivo pessoal.

Apesar de no grupo da Costa Rica serem quatro mulheres e um homem, Rachel diz que não vê predominância de mulheres maduras aprendendo a surfar em comparação ao número de homens adultos, como eu acreditava.

“Até tenho um pouco mais de alunas do que alunos, mas a diferença é pequena”, ratifica Pretão, que há 25 anos dá aulas de surfe no Arpoador.

Criador do Favela Surf Club, projeto que já tem 35 anos, Pretão conta que a presença de mulheres em suas aulas passou a aumentar de uns oito anos para cá e que cerca da metade dos alunos, entre homens e mulheres) deles tem mais de 40 anos.

Aumentam as clínicas só para mulheres

A procura feminina pelo surfe também tem criado um nicho de mercado. Clínicas ou surftrips exclusivas para mulheres. A campeã de longboard Chloé Calmon organizou uma clínica recentemente em Itamambuca e, nesse começo de setembro, Claudia Gonçalves está com uma clínica na Praia do Rosa, em Santa Catarina.

A clínica da Claudinha foi dividida em duas semanas. A primeira para um grupo de nove meninas iniciantes e a segunda, para outras nove, mais intermediárias. A próxima clínica será nas Maldivas, em outubro, com grupos iniciantes e intermediários. A surfista também tem um módulo avançado, para profissionais ou surfistas com experiência que desejam aprimorar seu surfe.

Surfe é amor. E amor não tem idade.