Nasci no Rio de Janeiro e comecei a surfar no ano de 2000, quando tinha 11 anos, e como para muitos, foi paixão à primeira onda.

Por Guilherme Vilas, shaper da 1974 Surfboards

Lembro-me, com todos os detalhes, minha primeira onda e a sensação que tive, pois é a mesma que sinto até hoje: vontade de querer surfar novamente, sempre.

Aos 15 surfava sempre que podia, mas aos 18 anos comecei a notar certa falta de graça naquilo. A repetição ao executar as mesmas manobras, principalmente em ondas fracas e com pouca força. Aquilo me preocupou, pois eu pensava estar saturado de fazer o que mais amava.

E, de certa forma, estava mesmo…

Contudo, não seria a falta de vontade de surfar, mas a de usar o mesmo estilo de prancha, todos os dias. Porém, na época, não fazia idéia disso.

Quilhas de madeira feitas à mão; 1974 Surfboards

Ao olhar o cenário de surfe, notava as pranchas que os surfistas usavam e pensava que só havia aquilo: triquilhas convencionais e longboards. De fato era só isso que a maioria dos shapers fabricavam.

Mas para minha sorte, com uns 16 anos, um amigo me mostrou um vídeo que mudaria  minha trajetória dentro do surfe, o “5’5” x 19 ¼”. O vídeo, de 1997, foi lançado quando a tendência à época era pranchas acima de 6 pés e estreitas. 

Luz no fim do tubo

É possível imaginar o choque que todos tiveram ao ver vários surfistas influentes da época, quebrando o paradigma ao usar uma prancha fish 5’5”, em ondas grandes do North Shore havaiano. Afinal, a mentalidade era: quanto maiores as ondas, maior a prancha.

Além da surpresa, o melhor que aquele vídeo proporcionou foi a curiosidade incessante de querer saber como seria surfar com uma prancha daquelas.

Como as pranchas eram feitas à mão, não tinha como saber o volume (que é o poder de flutuação da prancha) e muito menos ter noção de medidas. Então, acabei pedindo para o shaper da época fazer uma fish, e ele fez uma 5’4”. 

Desde então, passei a usá-la em 80% das sessões de surfe e nas mais variadas condições. Foi paixão instantânea!

Mas o que mais me deixou feliz com aquele estilo de prancha foi a performance em ondas fracas e com menos força. Justamente onde eu tinha perdido a vontade de surfar, por não sentir mais prazer naquelas condições. Foi neste momento que me dei conta de que estava usando a prancha errada.

Aquilo me fez pensar: “Espera aí, se existe este estilo de prancha que eu nunca tinha ouvido falar, o que mais existe que eu não sei?”. Desde então, foi um caminho sem volta…

Com a rápida evolução da internet, comecei a pesquisar a fundo blogs e sites estrangeiros sobre pranchas fish. Simplesmente pirei quando vi uma fish twin fin com a quilha em formato keel fin. Elas são inspiradas nos primeiros designs do criador Steve Lis feitas na década de 70, na Califórnia. O mais curioso é que ele surfava de kneeboard (surfe de joelhos) e inicialmente este design foi desenvolvido para este propósito.

Assim que bati o olho nelas, achei o design mais bonito, comparado a qualquer outro. Curvas fluidas, bico redondo, aquela rabeta larga, com o swallow e as duas quilhas keel fin! Estava apaixonado, e mais uma vez, precisava saber como era surfar com aquela prancha. O que se tornou obsessão.

Caminho sem volta

E foi a partir daí que comecei a estudar sobre pranchas, hidrodinâmica e design de shapes. 

Graças ao fato de eu nunca ter encontrado no Brasil naquela época, a fish keel fin que tanto desejava, isto se tornou motivação. 

Atualmente, consegui realizar o sonho de poder produzir os mais variados estilos de prancha como shaper profissional no Brasil, e em países como Portugal, Califórnia e Austrália.

Para cada onda, há uma prancha certa

Na minha última viagem à Ubatuba, enquanto surfava em Itamambuca, reparei que a maioria dos surfistas continua escolhendo pranchas erradas.

Com condições fracas, ondas cheias, insistem em usar pranchas com pouco volume e design criado para atletas do tour, por exemplo, e não para um surfista da “vida real”.

Fish retrô modelos Classic Twin e Quad Fever

Pranchas de ultra performance realmente são muito indicadas para ondas com força e tubulares, mas à medida que o mar diminui e perde força, se o surfista só tiver essa escolha de prancha, ele não terá condições para extrair “o máximo da onda”. Inclusive, muitas vezes optam por deixar de surfar simplesmente por acharem não ser possível.

Com uma Fish Biquilha, 30 litros, (eu peso 72 quilos), a sensação que tive era que somente eu conseguia aproveitar as ondas da forma mais apropriada para aquelas condições.

Aliás, o que eu mais notei foi surfistas remando sem conseguir sequer entrar na onda. Ou quando entrava, a prancha não tinha características e flutuação adequadas.

Pensando sobre isso, lembrei de uma frase dita por Rob Machado, que sintetiza muito bem a situação: ele afirma que 95% das pessoas surfavam com as pranchas erradas na década de 90. Porém, arrisco afirmar que até hoje este número continua bastante alto.

I’d say 95% of the people surfing in the 90’s were on the wrong surfboard.

Rob Machado (Fish: The Surfboard Documentary)  

Ou seja, para todos os tipos de onda existe uma prancha indicada.

Por fim, acredito que o surfista brasileiro ainda está muito preso ao conceito da prancha thruster (triquilha), performance. De modo que não se dá conta que existem inúmeras inúmeros estilos de pranchas como: Biquilhas, Fish, Monoquilhas, Mid Lengths e Longboards, com opções de volume, rocker (curvatura de fundo da prancha), configurações de quilhas, que iriam expandir (e muito!), as percepções e possibilidades nas mais variadas condições de onda.

Afinal, existe um mar lá fora cheio de possibilidades!

Conta pra gente, qual a sua prancha certa?

Fale com o autor do texto e shaper: https://www.1974surfboards.com/entre-em-contato/